A Casa de Deus
A casa de Deus está assente no chão
Os seus alicerces mergulham na terra
A casa de Deus está na terra onde os homens estão
Sujeita como os homens à lei da gravidade
Porém como a alma dos homens trespassada
Pelo mistério e a palavra da leveza
(…)
Esta casa é feita de matéria para habitação do espírito
Como o corpo do homem é feito de matéria e manifesta o espírito”
…alimentada por muitas vontades
Nasceu uma ideia…
O olhar de Miguel Unamuno não ficou indiferente à harmonia que experimentou ao visitar Espinho e ao observar as suas gentes. O escritor partilhou com os leitores aquilo que o surpreendeu, escrevendo no seu livro Por Terras de Portugal e de Espanha: “Nesta parte da costa portuguesa, junto ao lavrador vive o pescador. Aquele, semeia o linho e faz as cordas das redes com que este pesca, fornece-lhe madeiras para os seus barcos”.
Nesta caracterização sobressai a comunhão de esforços e a combinação de atividades em prol de um bem comum A mais impressionante descrição de uma construção rende sempre homenagem à comunhão, onde a vida é gerada no sonho de Deus e nas obras do homem.. Foi assim ontem e hoje também terá de ser assim.
Só esta união de vontades podia ter permitido a edificação da Igreja Matriz, inicialmente dinamizada pelo Padre Manuel Nunes de Campos. Era um projeto ambicioso para a época: preconizava um edifício de grandes proporções, financeiramente muito exigente. A sua construção começou em 1902 para substituir uma capela, com culto a Nossa Senhora da Ajuda, que funcionou como Matriz até ser destruída pela força do mar. Sobre o comportamento do povo de Espinho nessa destruição, diz-nos Álvaro Pereira na sua Monografia: “Lutou contra o mar, quando as suas casinhas, uma a uma, ruíam perante o ímpeto das águas ou com falta de base nas areias que as sustentavam. Viu cair a sua velha Igreja, feita com o amor e o suor do seus habitantes, que mais choraram a casa que era de todos, que as próprias que lhes serviam de lar.” (Pereira, 1970, p. 9)
Pelas mãos do Pe. Joaquim Amaral, em junho de 1923, recomeçaram as obras. Deram-se como finalizadas na década de 40, apesar de já ter sido dedicada em 19 de Junho de 1916 e anteriormente aberta ao culto, no ano de 1909.
A Igreja Matriz de Espinho é uma construção neorromântica, de grandes dimensões, com vários volumes arquitetónicos e a torre incorporada na fachada, segundo o projeto do arquiteto Adães Bermudes. A distinta altura dos vários elementos resulta num escalonamento de volumes articulados e subordinados uns aos outros. A luminosidade da Igreja é assegurada pela sábia disposição de vários vitrais e pela cor branca das paredes. Apresenta oito altares laterais em madeira de castanho. Num deles sobressai a imagem de Cristo Crucificado, escultura de Teixeira Lopes.
O relógio sineiro, marcando o tempo de cada dia, vai perpetuando, ao meio dia, a “Miraculosa”, melodia da autoria de Fausto Neves e letra de Carlos Morais.
Sucederam-se restauros…e impõe-se que assim continuem a suceder…
Como em qualquer obra, o projeto é dinâmico e sempre passível de melhorias. Por mão do pároco, padre Manuel Henriques Ribeiro e para melhor serviço da liturgia e oração, a igreja foi dotada de um órgão de tubos de autoria de Georg Jann, inaugurado a 16 de Julho de 1990. Dois anos mais tarde é complementada com uma capela mortuária, de autoria do arquiteto Carlos Nuno Lacerda Lopes. A escultura de Nossa Senhora da Ajuda, orago da igreja e da paróquia, no cimo da torre, por se ter deteriorado a original, foi substituída, em janeiro de 2001, por outra do escultor Paulo Neves, encomenda do Padre Manuel Henriques Ribeiro.
Perecível, como tudo o que é matéria, o edifício requer constantes restauros. No ano de 2015 terminaram as obras de restauro exterior, encomendadas pelo pároco José Pedro Azevedo e já se iniciaram as de restauro do interior (auscultação da população, apresentação dos projectos, escolha do projecto), sob a responsabilidade do pároco Artur Pinto.
O futuro é um lugar aberto…
Importa ser digno desta herança, honrando-a com a sua preservação, melhoria e engrandecimento.
Sempre que abrimos as portas deste lugar, sentimo-nos em casa. Talvez não haja nada mais reconfortante, estar ali, onde o passado e o futuro se encontram nas mãos que continuam a erguer-se, celebrando a vida e o seu sentido, investindo as forças da sua alma e os recursos do seu talento artístico e onde temperam o seu sentido cívico, em ânsia pelo crescimento da fé, até à hospitalidade absoluta em Deus.
Sintamo-nos em casa neste lugar para onde convergiram as gerações que nos precederam, onde celebraram a vida e o seu sentido, onde investiram as forças da sua alma e os recursos do seu talento artístico e onde temperaram o seu sentido cívico, em ânsia pelo crescimento da fé, até à hospitalidade absoluta em Deus.