
AMANHECE NA
TUA PRESENÇA
O amanhecer continua a tecer as linhas que desenrolam a tátil esperança que limpa o olhar. Pouco ainda para escrever. Só letras pequenas. Nada de capitais. Ai de mim querer viver eternamente. Ai de mim querer viver… ai de mim querer. Tudo é dom.
Encontro ao amanhecer. De nada serve querer apressar a noite. Ela dura o tempo em que não sabes partir. Cada tempo partido traz consigo novas letras para escrever a presença entre as fraturas humanas. Enquanto gritam o desejo de reverter a dispersão pelos séculos. Ai de mim querer gritar. Em mim ca um lar disperso
se não encontrar lugar para todos os fraturados nos séculos.
DOMINGO
E quando Se pôs à mesa, tomou o pão, recitou a bênção, partiu-o e entregou-lho.
Nesse momento abriram-se-lhes os olhos e reconheceram-n’O. (Lc 24,29-31)
SEGUNDA-FEIRA
A surpresa de quem se antecipa abre caminhos para a esperança e apressa os passos para o amor se continuar a antecipar.
TERÇA-FEIRA
A antecipação do amor não pode ser retida nem preparada. É sempre uma surpresa que transborda em muito o esperado.
QUARTA-FEIRA
A antecipação é o instante do olhar profundo que reconhece a presença, desvelando a realidade.
QUINTA-FEIRA
As palavras que beijamos esquivam-se a deixarem-se surpreender. A antecipação é dardo lançado ao coração.
SEXTA-FEIRA
A manhã não tem hora marcada. A luz pode despontar antes do sol nascer. Acorda com a paz que entra pelo coração do encontro.
SÁBADO
A dureza do coração não permite a surpresa e não deixa que nada se antecipe, tudo é programado. Só o amor faz da vida um programa sem programação.
ORAÇÃO
Quando contemplo a noite
E não me fecho na sua obscuridade
Mais densa,
Mais a minha retina
Estala de admiração
No meio de estrelas fugazes…
É tempo de Ressurreição.
Se a minha atitude vital procura
Pacificar tensões,
Renovar ilusões,
Tecer laços de concórdia,
Libertar os corações do ódio…
É tempo de Ressurreição.
Anselm, G.
POEMA
Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada,
aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
Carlos Drummond de Andrade
